sexta-feira, 31 de julho de 2009

Momento...

Ceres recebeu um e-mail de sua amiga Bruma. E-mail é essas coisas da modernidade, uma especie de carta, mensagem que vem pelos fios, pela energia e não, me pergunte como que não sei explicar, o seguinte texto:

"Essa justiça que vela meu sono, eu a repudio, humilhada por precisar dela. Enquanto isso durmo e falsamente me salvo. Nós, os sonsos essenciais. Para que minha casa funcione, exijo de mim como primeiro dever que eu seja sonsa, que eu não exerça a minha revolta e o meu amor, guardados. Se eu não for sonsa, minha casa estremece. Eu devo ter esquecido que embaixo da casa está o terreno, o chão onde nova casa poderia ser erguida. Enquanto isso dormimos e falsamente nos salvamos.
Tudo isso, sim, pois somos os sonsos essenciais, baluartes de alguma coisa. E sobretudo procurar não entender.
Porque quem entende desorganiza. Há alguma coisa em nós que desorganizaria tudo - uma coisa que entende. Essa coisa que fica muda diante do homem sem o gorro e sem os sapatos, e para tê-los ele roubou e matou; e fica muda diante do S. Jorge de ouro e diamantes. Essa alguma coisa muita séria em mim fica ainda mais séria diante do homem metralhado. Essa alguma coisa é o assassino em mim? Não, é o desespero em nós. Feito doidos, nós o conhecemos, a esse homem morto onde a grama de radium se incendiara. Mas só feito doidos, e não como sonsos, o conhecemos. É como doido que entro pela vida que tantas vezes não tem porta, e como doido compreendo o que é perigoso compreender, e como doido é que sinto o amor profundo,...

O que eu quero é muito mais áspero e mais difícil: quero o terreno."

“Crônica da morte de Mineirinho”, em 1962, de Clarice Lispector.

Ceres, a flor da pele, deixou escorregar em seu rosto uma lagrima, talvez duas, quando o ponto final da mensagem avistou. Pensou Ceres que talvez ela pudesse ter escrito as linhas recebidas. Não que Ceres seja egoísta, mas este é exatemente o sentimento agora de Ceres.

Ceres, Ceres...

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