domingo, 9 de agosto de 2009

Asas

Primeira Parte

Noite passada, antes de se deitar, Ceres pensou em escrever algo. Estava com a cabeça repleta de coisas, mas não organizadas. Saiu então na sacada de seu quarto, o luar fazia com que seus cabelos brilhassem, seu rosto era tocado pelo carinhoso vento que passava. Ceres fechou o olho e sentiu-se muitíssimo bem. Lá permaneceu por pouco mais de sete minutos. Foi então que Ceres sentiu que o sono lhe deu um confortável abraço.

Ceres não queria dormir. Sentia que ainda tinha que fazer alguma coisa. O que sentia não conseguia dizer, nem escrever, não conseguia expressar-se, era algo realmente inefável. Mesmo assim, abraçada pelo sono, levemente despiu-se e vestiu-se com a roupa de dormir, que era confortável e azul da cor do mar. Desamarrou os cabelos e os penteou via sua imagem refletida em um espelho arqueado. Passou creme pelo seu leve rosto. Caminhou até a cama, onde Heráclito já havia adormecido, deitou-se ao seu lado, acariciou-o e desejou em pensamento que ele tivesse bons sonhos. Ajeitou o travesseiro, primeiro o maior, depois o menor – Ceres possui dois travesseiros, um deles, o menor, é como se fosse um “ursinho”, ela sempre dorme agarrada com ele, e o procura quando este cai ou perde-se por entre as cobertas durante a noite - deitou-se e levemente fechou os olhos.

De olhos fechados, Ceres via uma clareira. Estava tão claro que Ceres mal conseguia visualizar o que tinha ao redor. Era uma claridade incomensurável a qualquer claridade que possamos falar. Ceres então, pouco a pouco foi abrindo seus olhos negros. Boquiaberta ficou quando ao seu redor conseguiu mirar.

Encontrava-se em meio a uma clareira que parecia estar no meio de uma floresta. Foi andando ao redor, e por dentre os troncos das arvores, alguns finos e outros grossos, nada conseguia ver. Era escuro, assustador. Parecia escutar algo, mas ao redobrar sua atenção, nada mais ouvia.
Aquela claridade já estava incomodando Ceres. A luz era muito brilhante, os olhos de Ceres já estavam cansados de tanta luminosidade. Mas ela não sabia o que fazer, o claro estava lhe incomodando, mas quando pensava no escuro que podia adentrar sentia medo. Não sabia o que fazer. Sentou-se. Levantou-se, mirou ao redor com a mão na testa para tentar ver um pouco mais além. A claridade já estava irritando-a. Andava em círculos, de cabeça baixa pensando no que podia fazer. Nada via além. Nada escutava também.

Quando de repente, sentiu que uma sombra tinha passado sobre sua cabeça. Olhou para cima, mas a luz era muito forte, que suas vistas não podia alcançar a verdade. Percebeu que a sombra girava em sentido contrário ao que ela estava andando. Passou-se alguns momentos e não mais percebeu a sombra. Tentava de todas as maneiras olhar para onde tinha ido aquilo, seja lá o que fosse, mas não conseguia, a luz era forte demais. Cansada então, retornou tristemente a passos estreitos e sem pressa alguma ao centro da clareira. Sua cabeça estava baixa, olhava apenas o chão, que era marrom, cor de terra. Não conseguia mais pensar em nada. Poderia dizer que neste momento ela nem mesmo sabia quem era, ou o que era.

Ao chegar ao centro da clareira, sentiu uma espécie de vento, brisa, algo que acariciou seu rosto, mas não conseguia descrever a sensação. Sentiu-se leve como uma pena e foi ai que olhou horizontalmente e viu no meio exato da clareira, um pássaro.

Tinha as penas azuis, formava um degrade magnífico de todas as tonalidades de azul, algumas delas desconhecida dos saberes de Ceres. Espantada, Ceres, ficou imóvel. Nunca tinha visto algo assim. Um pássaro, azul e de tamanho inigualável a todos os que Ceres já tinha visto. Ele tinha a sua altura. O bico dele era amarelo ouro, o olhar acinzentado. Passava uma energia muito delicada. Ceres com sua sensibilidade a flor da pele, pode sentir leveza no olhar e no jeito delicado do pássaro. O pássaro então se mexeu. Ceres afastou-se, não era medo, talvez receio. Ceres emudecida pode ouvir os pensamentos do pássaro. Ela não compreendia o que estava acontecendo. Eram sensações muito novas. Era como se a voz do pássaro adentrasse em seu corpo, sua mente. Entendia perfeitamente as sensações que o pássaro sentia. Serenamente Ceres se aproximou, no mesmo instante em que o pássaro também mexeu-se em sua direção.

A sensação que Ceres teve foi de leveza. O instante foi ficando um pouco mais claro, mas uma claridade que agora se podia enxergar com mais nitidez, com olhos totalmente abertos e sem a mão a fazer sombra sobre a testa. O pássaro deu um passo em direção a Ceres, enquanto Ceres deu outro em direção ao pássaro. A sensação de encanto estava passando e agora os dois podiam ter uma relação de entendimento mutuo.

Ceres foi convidada pelo pássaro a dar um passeio com ele. Ceres deu um passo para traz. Sacudiu a cabeça, dizendo mentalmente que não. Ela sentiu uma aflição ao entender o convite que o pássaro lhe fez. Mas não resistiu ao segundo convite feito por ele. Ele passava uma serenidade sem igual.

Ceres deu um passo em direção a ele, mas ele já veio mais rápido em direção a Ceres. Como que por mágica, o pássaro abaixou-se rapidamente e Ceres montou em suas costas. A mágica se confirmou quando o pássaro começou a bater as asas, Ceres escutou barulhos de cristais chocando-se uns aos outros, e um pó finíssimo começou a cair do céu, parecia pó de estrelas...e foi quando o pássaro então saiu completamente da chão e começou a sobrevoar a clareira.

O vento batia no rosto de Ceres, que não sentia medo, ela na verdade nem sabe o que sentia, não havia espaço naquele momento para pensar um nome para tal sentir, o que importava naquele momento era puro e exclusivamente o momento, o depois era algo fora daquela realidade fantástica vivenciada. O barulho das asas do pássaro contra o ar era como o som de uma harpa, e Ceres parecia sentir estar valsando no ar.

Foi ai que....

Ceres, Ceres....

Marcinha Luna

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